Aventuras incríveis ao longo da história foram acompanhadas, e às vezes até dependentes de, cachimbos, como o naufrágio do Sir. Ernest Shackleton na Antártida a bordo do navio de exploração Endurance (lit. resistência)*.
Em 1914, Shackleton liderou uma expedição de 27 homens para ser o primeiro a atravessar a Antártica a pé. Em 1914, obviamente, eles não tinham as vantagens de roupas ou alimentação modernas, orientação eletrônica ou localização por GPS e, o mais importante, não tinham comunicação por rádio e não tinham como enviar um sinal de socorro. As aventuras eram mais perigosas 100 anos atrás.
Eles fizeram isso porque eram “homões” (homens viris) explorando o mundo, e a Antártida estava lá. Essa é a razão pela qual aqueles exploradores precisavam se colocar de boa vontade no ambiente mais inóspito da Terra: serem os primeiros a realizar uma tarefa assustadoramente árdua e aparentemente impossível.
Eles não tiveram sucesso. Eles tiveram que mudar para o modo de sobrevivência antes mesmo de tentar. No entanto, se medirmos sua conquista em termos de pura força de vontade, superando as probabilidades impossíveis, o fracasso deles está entre os maiores triunfos humanos.
A expedição encontrou-se travada no gelo a 85 milhas da costa, e durante os dias seguintes, a tripulação assistiu como o Endurance foi esmagado e se desfez. É impossível entender o que deve ter sido ver o único meio de volta para casa sendo destruído diante dos olhos. Sem navio e sem meios de se comunicar com o mundo, eles estavam sozinhos no gelo com apenas alguns botes salva-vidas pesados de madeira e suprimentos que poderiam descarregar do navio.
Shackleton decidiu que eles arrastariam os botes salva-vidas pelo gelo para abrir a água e assim velejar para encontrar ajuda. Cada homem podia pegar dois quilos de pertences pessoais e um quilo de tabaco para cachimbo (isso mesmo meu amigo, 1kg de tabaco para cachimbo). Esse é um detalhe fascinante sobre o tabaco para cachimbo. Ele era claramente visto como uma ferramenta essencial de sobrevivência, suficientemente importante para explicar um terço das posses de cada homem.
Certa noite, acampados em suas tendas sobre o gelo, uma fissura se abriu embaixo deles e o tripulante Ernest Holness acordou submerso naquela água congelante. Shackleton enfiou a mão na fenda, pegou o saco de dormir e puxou Holness para cima antes que a fenda se fechasse. Holness, cuspindo, congelado e quase afogado, tinha apenas uma queixa: “Eu perdi meu cachimbo”, ele resmungou.
Os homens acabaram encontrando águas abertas e velejaram seus botes salva-vidas para a Ilha Elephant, uma rocha deserta povoada por pouco mais que arbustos espinhosos, pedras e líquens[1]. Shackleton então levou uma tripulação de seis pessoas, incluindo ele próprio, em um dos barcos, para percorrer 800 milhas até uma estação baleeira na Ilha Geórgia do Sul. Todos os demais estabeleceram um acampamento e se prepararam para sobreviver até o retorno de Shackleton.
O suprimento de tabaco deles foi reduzido a nada, e o contingente da expedição da Ilha Elefante passou seus dias tentando encontrar substitutos para o tabaco. Em um experimento, eles ferveram os cachimbos de todos os homens com as algas marinhas que usavam para encherem as botas. Esperavam que o tabaco residual, o cake e o tabaco não queimado dos fornilhos impregnassem as algas com suas características. Que fracasso.
A expedição passou 20 meses no gelo antes de ser resgatada. Uma das maiores histórias de aventura de todos os tempos. Shackleton foi capaz de navegar em mares tempestuosos, em um pequeno barco de madeira, e conseguir um resgate para toda a tripulação. Eu recomendo o livro Endurance[2], de Caroline Alexander, no qual ela oferece não apenas detalhes incríveis da aventura, mas também fotos notáveis do fotógrafo da expedição. É certamente uma história com a qual todos os cachimbeiros e entusiastas do cachimbo deviam estar familiarizados, pelo simples fato de que os cachimbos eram parte essencial da saúde mental da expedição.
Às vezes, tomamos nossos cachimbos como garantidos, mas devemos lembrar que, em tempos de enorme estresse, os cachimbos têm sido excelentes fontes de amparo e auxílio ao longo da história moderna. Se fizeram 20 meses em tendas na Antártica mais “aptos à sobrevivência”, imaginem o que eles podem trazer para nossas vidas diárias.
Texto original de Chuck Stanion (www.smokingpipes.com)
Livremente traduzido por Jader Carlos, o novato.
[1] Planta simples e de crescimento lento que normalmente forma uma crosta, folhas ou ramos em rochas, paredes e árvores.
[2] Encontre o livro aqui: https://bit.ly/2BWBQCY